sábado, 9 de abril de 2011

Prenúncio

Olhei-te
Como da primeira vez
Tão forte quanto o demais
E esse olhar
Que me ofereceste sem querer
Devorei-o sem te aperceberes
A tua respiração
Vincada nos meus lábios
Ainda me promete esse beijo
E o que sinto
Ainda que através de mim
É-o no teu corpo, tão em ti
Vais falar-me
Contar-me trivialidades
E segredar-me silêncios ao ouvido
E eu tocando-te
Na medula dos teus sentidos
Vou arrancar-te suspiros mudos
É o prenúncio
Do descontrolo corpóreo
Ditado pelos recônditos da alma

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Calo

Sabias que o calo reprime a sensibilidade?
Doses de uma cinética encoberta
No peito. Pela pele, pela carne.
Em caixa torneada por vestes.
Ficou o osso. Aspecto de consumo.
E o leite em Sol amamentado
A ti regresso.
Sem vestes torneadas.
Na carne, na pele. Com o peito.
Sensível a ti.
É porque te sinto se me calo.

Somatização

Eu. Associação. Eu
Associa-te a mim.
Que eu sou. És tu.
Em sigla EPI
Eu por inteiro.

Pouco sério

Sorri.
Só ri p’ra ti.
Sorri p’ra ti.
Só ri.

Anomia espacial

.a luz está em cima
porque o candeeiro
está na parede
que está em cima
das paredes
que estão em cima
do chão.
.essa parede
a de cima
está perpendicular
às paredes
que estão
paralelas
à parede
que está em cima
das paredes verticais
e perpendiculares
à parede de baixo.

Precária

Muda-se o nome na tempestade.
Precária. Não o nome. A mudança.
Dilacera-me em gotas golpeantes
De um estado absorto do nada
Fulguração de pequena espada
Morte certa. Fraca e estada
Se foste tu. Tu. Não o sabias
Se virias. A ser. Tu não eras
Por certo toquei no que julguei
Por fora de mim
Eras fora. Por dentro estavas
Seca-te. Disseca-te em nós.

"Turbulência - simples como a verdade"

Existe. Agride. Enlouquece. A turbulência.
Do caos nasce a estrela.
Nos momentos de crise, o avanço.
Tempestade de íris.
Simples.
Tão autêntica.

Inspiração

Sopro inverso que de fora nos penetras
O fechar de olhos no entremente.
Depois da inspiração.
Inspira. Agita-te. Expira. Sê.
Inspiração de suspiro.

Melopeia em boca

Embalaste a melodia.
A melodia. Embalaste.
Na ternura do doce.
Com grãos de açúcar.

Algodão doce

Ela. Tão ela. Esta cegueira. Este mal rosa. Vejo como ontem. Como vi. Esse pôr-do-sol. Claro. Clareado. Rosa. Este mal rosa. Finjo. Fujo no fingimento. E se finjo. Finjo só no fugir. Ainda mais só. Fujo e finjo. Este mal rosa. Que é rosa. Que possui. Perfume de pétala. Pétala rosa perfumada. Macio, suave, doce, cálido e constante. Revigorante. Errante. Ela. Tão ela. Este mal rosa. Rosa em tons claros. De gotas impermeáveis. Ficáveis. Que fluem. Sorrateiras no cair. Morosas. Parto antes. Volto depois. Ainda na gota. Na pétala ainda. Contínua ela. Nela. Nesta cegueira. Neste mal rosa. No mesmo perfume. No mesmo tom. O mesmo afinamento. Desafinado. Desalinhado. Desarmónico. A mesma. Eu. A mesma. Eu nela. Com ela. No mal. Rosa. Eu clareada de rosa. Afinada na cor. Na nuance. Ritmada. Decadente. A mesma. Sempre eu. Outra vez ela. Feliz. Errante. Sorrindo. Contente. Mais. E mais.

Visão fragmentada

Se olhei sem que me visses
É porque rodei a retina no teu olhar
Estive e fui presente no ser
Se perdurei em fragmentos tristes
É porque não foste, não quiseste ver

Foste. Fingi. Fingi ser.
Cortaste. Falaste sem ver.

Desmarcante

Porque te fugi. Sabias de cor o movimento.
Pareceu-te por certo tão meu. Que não o foi. 
E hoje… hoje não só não és, como deixaste de o ser, quando foste.

Sometimes

Sometimes all I want is cry
There times that I wonder
What’s my role in my own life?
Sometimes all I want is cry
There times that I wonder
Will it really be alright?
But I’ll be fine, I’ll be alright
I can feel it inside of me
I can taste it in every tear
Sometimes

Reinvenção

E na terra se reinventam odores desconhecidos
Sentidos, na palpável sensação do olhar
Incógnitos ainda no tacto impreciso
Como fragmentos de gosto absorvidos

Crepúsculo

Se eu te conhecesse, crepúsculo
Dourado que te deixaste dormir
Deitava-me alongada nas tuas plumas
Talvez sem saber não soubesse
Que te conhecia

Despertar

Quando acordei de súbito
Desapontada por ser um sonho
Movi-me apontante
Para a realidade que me habitava

O pensamento alenta o choro mudo

O pensamento alenta o choro mudo
Que o abraço da noite em ti se afigura
É um querer mais, um quase tudo
Um sentir que de só nunca muda

Uma folha que cai com gentileza
Que de nobre permanece levitante
Em frente, marcando passo com a certeza
De continuar feliz no caminho errante

Conhecimento

Já detenho o conhecimento
Das causas perdidas
Das ilusões do tempo
E das glórias vencidas

Choro

Choro por dentro por querer dizer
O que a mim própria proíbo
As lágrimas não me tocam por saber
Que cairiam em vão
Por certo no chão de um sentir

Alguma vez

Alguma vez tiveste vontade
Que uma viagem nunca mais acabasse?
Alguma vez quiseste conhecer
As ruas vizinhas do teu concelho?
Alguma vez quiseste não sair
Dessa peça de teatro
P’ra não saberes que a dor era real?

Tenho caminhado descalça

Tenho caminhado descalça
Colhendo as flores
Deixando sementes
E o caminho me presenteia
Com a certeza da existência
Calejando meus pés

Daquela que se foi

Daquela que se foi
Tu não sentiste o perdão
Foi um partir sem hora

Que posso eu fazer
Na medida das coisas
Por um pedido de nada?

Rompeu-se a hora que faltava

Rompeu-se a hora que faltava
Ficou um estado de graça
Quase santa, mal tocada
Perdeu-se todo o não ter
De quase nada
Tu olhavas-me e eu sorria
Como que mal perdida
Não encontrada
Disse pouco, fingi-me engraçada

Encontro

Encontrei-me agora
Pena o agora já não ser
O mesmo momento de antes
Sempre tão transeunte
Mas vou procurar a fórmula
De anular o verbo ir no presente
Poder… sei lá!... tornar-me mais constante
Dinâmica de uma forma diferente

Na soberba loucura

Na soberba loucura
Do teu olhar partido
Construído
Por um trilho
Contido em mim
Pensei-te diferente
Realidade ilusória
D’uma lágrima que chora
Verdadeira, presente

Tenho que perceber que…

Tenho que perceber que…
Há pessoas que não funcionam
Sob a ordem natural das coisas
E… funcionando o mundo
Numa tendência da normalidade
Não posso concebê-lo
Por mais do que algo pontual
E sem continuidade
O anormal não acontece
Numa perspectiva de pensamento
Que aconteça… mesmo que errante
Mas ao menos, que não pense!

Descabimento

Também te amo
De um jeito que
Não me amaste um dia
Também te estranho
Toda essa simpatia
Disfarce da ironia
Que o tempo nos permitiu
Pedaços fragmentados
Da realidade que partiu
Porque não cabia
Onde eu queria estar
Onde querias tu
Eu não sabia

Os papéis que te escrevi

Os papéis que te escrevi
Outrora afugentados
Por pedaços de mim
Reclamam

Eu sou

Eu sou
O papel que definha
Na tua mão fechada.
Sou
Uma palavra calada
Escrita em gatafunhos.
A essência perdida
No cruzar de mundos.

Mentira verdadeira em ecos

Contei uma linda mentira
Na qual acreditaste
Pela intensidade dos sentimentos que julgaste
Que nos meus olhos vias
E até eu quase acreditei
Deleitando-me nas doces palavras que não ouvia
Quando finalmente olhei para o lado
Caminhava sozinha
As árvores continuavam floridas
Os rios chilreavam as suas melodias
O Sol mantinha-se em cores de Outono no seu pôr
E o calor acariciava-nos as faces.
Mas tu, tu lá não estavas
Era só eu sintonizando uma frequência que não existia
Ao longe podiam ouvir-se os ecos melodiosos
Ecos no coração vazio

Ah! Tempos d’outrora no presente

Ah! Tempos d’outrora no presente
Bengala de chuva e ainda outra
Que ao sair da porta me tente
Num balanço de ajuda embora pouca

Bom dia! E educação prevalece
Bom dia! A Primavera persiste
Nem o tombar da chuva se esquece
De mim, no outro, o amor que existe

És nuances camaleónicas, a portuguesa

És nuances camaleónicas, a portuguesa
Cujos passos fremitam em paredes nobres
A aparente ignóbil de idónea certeza
A acrisolada que em manto ébrio te cobres

És a esteira plácida em ermo monte
E a esfuziante que a luz ilumina
A água límpida que brota da fonte
Em corpo áureo, escondido na mina

Professias

Professor do novo ano
Que professias me trazes?
Melancólicas, quentes, audazes
Recheadas de profano
Santas, intensas, fugazes
É o desengano que me aquece
Chama acalentada em prece

Ser sonhado

Que tanto sonho por não ser
Pela ausência d’uma presença
Que não se senta à mesa
Por uma indiferença que vejo correr
Leves os meus olhos no teu sótão

Sopro ao Coração

Queria falar do meu coração
Falar-me ao coração
Queria só calar-me e ouvi-lo
Queria ouvi-lo bater
E senti-lo saltar
Queria vê-lo tremer
Queria só olhar para ele
E saber-lhe a cor
Sabê-lo de cor
E poder declamá-lo salteado
O meu coração, eu queria
Pegá-lo na mão
E sussurrar-lhe ao ouvido
Aquela doce canção